NOITES DE DEZEMBRO

Sinos cantando... Noites de Dezembro.
Dlin... Dlon... É a procissão que vai passando...
Recordar é sofrer! Quando me lembro
Antes de me lembrar, já estou chorando.

A luz dos combustores
[1] fumarentos,
Numa piedosa e mística atitude,
Levanta-se, nos seus esbatimentos
[2],
A Igreja da Senhora da Saúde.

Lá dentro, no interior, o triste choro
Do órgão velho soltando uns sons antigos.
E na porta da entrada ouve-se o coro
Dos que pedem cantando, dos mendigos.

E o luar bate cá fora nas calçadas,
Um luar de trovadores e poetas...
As estradas estendem-se... as estradas
Na precisão das suas linhas retas.

As árvores do pátio, em simetria,
Velhas, fingindo eterna mocidade,
Dão sombra a quem procura a sombra fria
E a mim que vivo longe, — dão saudade.

Dezembro. Mês de festas... A humildade
Da gente pobre que se agita em bando...
Noites da minha terra!... Que saudade!...
Dlin... Dlon... É a procissão que vai passando...



(de Ângelus, 1911)

[1] COMBUSTOR: poste para iluminação pública.
[2] ESBATER: estar com cores suavizadas.